Dando sequência ao Artigo de Missão
Integral: Um Convite à Reflexão escrito por Ricardo Quadros Gouvêa publicado no Site da FTL.
PARTE 2
2. Evangelho e Política
Há quem diga abertamente que o Evangelho nada tem a ver com política. Há quem
deplore que se discuta o que se chama vulgarmente de “questões políticas” na
igreja. Quando vemos o péssimo exemplo dos políticos evangélicos, até
entendemos a razão desse tipo de ojeriza à política. Mas, em geral, é fruto de
uma pregação evangélica distorcida que aliena as pessoas, fazendo-as pensar que
as questões políticas e sociais nada têm a ver com espiritualidade.
A relação entre cristianismo e política não deve ser confundida com a relação
entre igreja e estado. A separação entre igreja e estado foi uma preciosa
conquista da democracia. Ela garante a liberdade de culto e garante que, na
ausência de uma religião oficial do estado, nenhuma instituição religiosa será
privilegiada pelas leis do país. Isso nada tem a ver, no entanto, com a relação
entre cristianismo e política. O verdadeiro cristianismo, me parece, está
envolvido nas questões sócio-políticas até o pescoço. Ou talvez deveríamos
dizer: até a cabeça, que é Cristo.
Sabemos que a Bíblia e o Evangelho nos convidam a um sério engajamento com os
problemas sociais, econômicos e políticos. O quietismo supostamente presente em
Romanos 13 empalidece ante as inúmeras passagens bíblicas nos convidando à
denúncia e ao combate das injustiças sociais e os desmandos políticos. Os
estudos contemporâneos sobre os tempos de Jesus e sobre sua pessoa e
ministério, como os de Marcus Borg, John Crossan, Richard Horsley, e N. T.
Wright, entre outros, tornam patente o fundamental elemento sócio-político de
sua missão.
Isso nos convida a entender o que é a ação política que tem lugar no contexto
do Evangelho. Não estamos falando de política partidária, que visa a obtenção e
manutenção do poder. A ação cristã na política partidária é, em geral, fisiológica
e clientelista, em benefício de igrejas, inclusive, e é, em suma, má política e
mau cristianismo. Estamos falando de cidadania e consciência política do
cidadão que leva a envolver-se nas questões sócio-políticas que o afetam
diretamente, e particularmente a formulação e promulgação de leis que o
beneficiam ou não, enquanto cidadão.
Esse é o problema da ação social assistencialista, que é o que os evangélicos
praticam, em geral, e que às vezes se confunde com Missão Integral e com
consciência cidadã e sócio-política, quando não é. O assistencialismo não
resolve os problemas sociais e políticos porque não atinge o cerne das
questões, não desce às estruturas, não ameaça os poderosos. Pelo contrário, o
assistencialismo se encaixa perfeitamente no modelo dos poderes opressores de
uma sociedade. Por isso, as igrejas não são combatidas, porque não ameaçam
esses poderes políticos e econômicos. Se o fizesse, seria perseguida.
O que seria, então, uma igreja engajada numa luta pela cidadania e pela
conscientização sócio-política? Seria uma igreja que estimulasse os seus
membros a protestar, por meios legítimos e não-violentos, como passeatas e
abaixo-assinados, reivindicar ante as autoridades, e, por fim, exigir leis mais
justas e ação governamental voltada para a melhoria das condições de vida dos
menos favorecidos. Não é isso que acontece nas igrejas evangélicas.
Eu tendo a pensar que o que a FTL entende por Missão Integral implica em uma
restauração da integralidade do Evangelho de Cristo, hoje obliterado nas
igrejas evangélicas, por meio de uma compreensão da relação tensa e paradoxal
entre Evangelho e Cultura que nos desafia com o poder de Cristo para a
transformação da cultura, e por meio de uma compreensão da relação entre
Evangelho e Política que nos faça perceber as dimensões políticas e
sócio-econômicas da pregação de Cristo.
Leia a terceira e última postagem de desse artigo.
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